quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Bolo Rei: História, Lenda e Tradição





Não é possível falar de Natal sem falar de bolo rei, sendo quase presença obrigatória em todas as mesas da época natalícia. Este bolo está repleto de simbologia. Não é por acaso que tem forma de coroa e brilho nas suas frutas cristalizadas.

Reza a lenda que este doce representa os presentes oferecidos pelos Reis Magos ao Menino Jesus aquando do seu nascimento. A côdea simbolizava o ouro, as frutas secas e cristalizadas representavam a mirra, e o aroma do bolo assinalava o incenso. Ainda na base do imaginário, a existência duma fava também tem a sua explicação. Quando os Reis Magos viram a Estrela de Belém que anunciava o nascimento de Cristo, disputaram entre si qual dos três teria a honra de ser o primeiro a entregar ao menino os presentes que levavam. Como não conseguiram chegar a um acordo e com vista a acabar com a discussão, um padeiro confeccionou um bolo escondendo no interior da massa uma fava. De seguida cada um dos três Magos do Oriente pegaria numa fatia. O Rei Mago que tivesse a sorte de retirar a fatia contendo a fava seria o que ganharia o direito de entregar em primeiro lugar os presentes a Jesus. O dilema ficou solucionado, embora não se saiba se foi, Gaspar, Baltazar, ou Belchior o feliz contemplado.
É claro que isto é só uma lenda, historicamente falando, a versão é bem diferente.
Aproveitando um inocente jogo de crianças, os Romanos inseriram a sua prática nos banquetes durante os quais se procedia à eleição do rei da festa, que consistia em escolher entre si um rei tirando-o à sorte com favas, por isso designado por vezes também rei da fava.
A Igreja Católica aproveitou o facto de aquele jogo ser característica do mês de Dezembro e decidiu relacioná-lo com a Natividade e com a Epifania, ou seja, com os dias 25 de Dezembro e 6 de Janeiro. A influência da Igreja na Idade Média determinou que esta última data fosse designada por Dia de Reis e simbolizada por uma fava introduzida num bolo, cuja receita se desconhece.
Havia ainda a tradição de que os cristãos deveriam comer 12 Bolos Reis, entre o Natal e o Dia de Reis, festa que muito cedo começou a ser celebrada na corte dos Reis de França. O Bolo Rei terá, aliás, surgido neste país no tempo de Luís XIV para as festas do Ano Novo e do Dia de Reis. Vários escritores da época escreveram sobre esta iguaria e Greuze celebrou-o num famoso quadro, com o nome de Le gâteau des Rois.
Com a Revolução Francesa em 1789 este bolo foi proibido, “como mais tarde iria acontecer em Portugal”, só que os pasteleiros que tinham um excelente negócio em mãos em vez de o eliminarem decidiram continuar a confeccioná-lo chamando-lhe Gâteau des Sans-cullotes.
Assim parece não haver dúvidas de que o Bolo Rei tem verdadeiras origens francesas, apesar do Bolo Rei popularizado em Portugal no século passado nada ter a ver com o bolo simbólico da festa dos Reis, existente na maior parte das províncias francesas a norte do rio Loire e na região de Paris, onde o bolo é uma rodela de massa folhada recheada de creme. O nosso Bolo Rei segue a receita do sul de Loire, um bolo em forma de coroa feito de massa leveda. Acrescenta-se que ambos os bolos continham uma fava simbólica, podendo ser um objecto de porcelana.
Tanto quanto se sabe, a primeira casa onde se vendeu Bolo Rei em Portugal foi em Lisboa na Confeitaria Nacional, por volta do ano de 1870, bolo esse feito pelo afamado confeiteiro Gregório através duma receita que Baltazar Castanheiro Júnior trouxera de Paris. Durante a Quadra Natalícia a Confeitaria Nacional oferecia aos lisboetas uma exposição de tudo quanto de mais delicado e original a arte dos doces podia então produzir. A pouco e pouco, outras confeitarias passaram também a fabricá-lo, o que deu origem a várias versões. No Porto foi posto à venda pela primeira vez em 1890 por iniciativa da Confeitaria Cascais feito segundo receita que o proprietário Francisco Júlio Cascais trouxera de Paris.
Assim o Bolo Rei atravessou com êxito os reinados da rainha D. Maria II e dos Reis D. Pedro, D. Luís, D. Carlos e D. Manuel II. Vieram depois o Estado Novo de Salazar, Marcelo Caetano e a Revolução de 25 de Abril de 1974.
Contudo foi com a proclamação da República, a 5 de Outubro de 1910, que chegaram os piores tempos para o Bolo Rei, ficando em risco a sua existência. E isto tudo por causa da palavra “rei”, símbolo do poder supremo e que numa lógica de hoje nos faz rir -  morto este símbolo, o bolo tinha que desaparecer ou mascarar-se para evitar a guerra que lhe podia ser feita.
Os confeiteiros partiram do principio de que negócio é negócio e política é política e continuaram a fabricar o bolo sob outra designação. Os menos imaginativos deram-lhe o nome de ‘ex-bolo rei’, mas a maioria chamou-lhe bolo de Natal ou bolo de Ano Novo. A designação de bolo Nacional seria a melhor, uma vez que remetia para a confeitaria que o tinha introduzido em Portugal, e por estar relacionado com o país, designação que ficava bem em período revolucionário.
Não contentes com nenhuma destas ideias os republicanos mais radicais chamaram-lhe bolo Presidente até houve quem lhe chamasse bolo Arriaga. Não se sabe como reagiu o Presidente da República, mas convenhamos que a homenagem não era das melhores.
Passado esse período conturbado, a história deste bolo tem sido um grande sucesso e para isso contribuiu a  expectativa gerada em torno de quem comesse a fatia que continha a fava ou o brinde. A fava amaldiçoada pelos sacerdotes Egípcios, que a viam como alojamento para os espíritos, é considerado o elemento negativo, representando uma espécie de azar. Aquele que a encontrar na sua fatia tem duas opções: assumir o pagamento do próximo bolo, ou engoli-a, correndo perigo. Por sua vez o brinde era colocado no bolo com o objectivo de presentear os convidados com quem se partilhava o bolo. Havia quem colocasse nos bolos pequenas adivinhas, algumas bem complicadas, mas cuja recompensa seria meia libra de ouro. Outros incluíam propositadamente moedas de ouro na massa, uma forma requintada de agradecer aos convidados a presença. Infelizmente, com o passar do tempo, o brinde passou a ser um pequeno objecto metálico sem outro valor que não o de um símbolo, pouco evidente para a maioria das pessoas. As leis comunitárias ditaram o fim da tradição, proibindo que no interior do bolo se encontre uma fava ou um brinde.
Mesmo assim o Bolo Rei continua a ser um símbolo da época Natalícia, e hoje os confeiteiros e pasteleiros não se poupam a esforços na sua promoção, e as pastelarias com boas receitas, enchem-se de clientes para adquirir o rei das iguarias desta quadra festiva.
O Bolo Rei não se limita a ser um bolo com gosto agradável, ele é na verdade um verdadeiro símbolo desta época!
Depois de conhecer a história deste bolo não fica com vontade de comer uma fatia?
Aproveite porque o Natal está ai !!!

(com adaptações) retidado daqui